O pra sempre virou passado

Eu penso muito se você ainda pensa em tudo.
E não é que eu ainda goste de você, veja bem, tenho cada cicatriz decorada, de tanto que mediquei pra que elas parassem de arder e sangrar. Elas até pararam, mas não sumiram, só pararam de doer. Tem marca sua aqui em todo lugar e eu respeito cada alteração de epiderme que você deixou.

Não foi fácil partir, eu chorei calada porque eu sabia que já existiam mais motivos para ir embora do que pra ficar e tentar, e só eu sei quantas vezes eu tentei.
Tinha um silêncio em mim que ninguém escutava, mas que destruía tudo por dentro.
Eu vejo você tentar, vejo você repetir nossos planos, escrever nossa história com outro personagem e sei que você pensa em como seria se eu fosse a protagonista da sua vida.
Eu parti, mas fui com dignidade, porque eu sabia que eu tinha feito tudo por nós, sabia que cada dedo movido em vão doeu como um soco no peito, daqueles que te deixam sem ar.

O fim foi a parte mais difícil de toda a historia, os garçons e bartenders que o digam, os copos que passavam de cheios para vazios em segundos, a noite que acabava mais rápido que a minha dor, o orgulho que eu insistia em deixar aqui porque era a única coisa que era realmente minha naquele momento.
Não foi fácil deixar que outros corpos se apoderassem do que eu jurava que seria pra sempre seu, não foi fácil beijar bocas que eu nem estava tão afim, mas precisava me distrair com qualquer coisa que não fosse a maldita vontade de falar com você.
Houve noites em que eu imaginei se você estaria acordado pensando em pelo menos um pouco em tudo, houve noites que eu escrevi mensagens e textos de preencher a academia de letras inteira, nenhum enviado, não adiantava, alguns eu apagava pra ver se a saudade ia junto, não adiantava.

Houve noites que as minhas lágrimas caiam na tela do celular pra impedir meus dedos de digitarem. Houve dias em que as manhãs não eram de sol e até quando ele aparecia era pra queimar os meus olhos só pra eu saber que a vida não tava sendo legal comigo mesmo, afinal, eu não merecia que nada fosse legal comigo.
Demorei meses pra explicar pra mim mesma que não existia mais nós dois e era mais difícil ainda fazer isso em silêncio, porque eu queria mesmo era gritar, era rasgar todos os papeis da minha frente, era quebrar todos os vidros que eu encontrasse, eu queria que o universo soubesse que eu tava morrendo por dentro e o velório estava sendo longo.
Foi complicado entender que o “Pra sempre” tinha ido embora pelo ralo e a contaminada tinha sido eu, foi duro. Eu borrei maquiagens, tropecei em calçadas, virei doses fortes, tomei comprimidos, acendi cigarros, virei doses ainda mais fortes, perdi o rumo e nada adiantou. Eu vivi o inferno com o fogo mais quente e que só queimava em mim, eu era toda em cinzas por dentro.

Entende o trabalho que deu pra colocar o pouco que restava de mim nos eixos? Não, acho que você nunca vai entender.
Então não me venha dizer que nossa história acabou porque eu parti, porque eu só decidi fechar um livro que você estava rasgando página por página, eu só tirei de vez uma faca que você furava aos poucos. Eu só parti quando não havia mais jeito, quando não havia mais soluções, eu só parti quando meu coração já não aguentava as morfinas de conformismo que eu dava pra ele todos os dias, eu só parti porque você já tinha me deixado sem perceber.

Respeite as minhas decisões, você não imagina os dragões que eu tive que enfrentar por elas. Eu precisava que você percebesse as coisas antes e não me deixasse atravessar todos esses infernos sozinha, eu precisava que você puxasse meu braço e me salvasse da guerra que eu teria que enfrentar por tomar a decisão de ir.
Então, não olhe pra mim como se eu tivesse culpa do seu presente, não diga que eu mudei, eu não mudei, eu tapei buracos que você escavou e naturalmente o piso nunca mais vai ser o mesmo.